O coronavírus atinge outros órgãos?

Por: Dr. Rodrigo Motta 30 de abril de 2020

Especialistas alertam que além dos pulmões, o novo coronavírus pode atacar vários órgãos do corpo humano. Acometimentos por vezes graves dos rins, fígado, coração, cérebro e intestinos, têm sido observados em alguns pacientes, à medida que a pandemia se espalha pelo mundo.

A maioria dos pacientes graves tem sido acometida por microtrombos. Na circulação pulmonar, esses microtrombos não deixam o sangue chegar aos pulmões para efetuar as trocas gasosas. Uma pesquisa recente mostrou que 38% de 184 pacientes de Covid-19 numa UTI holandesa apresentavam coagulação sanguínea.

Esses pequenos coágulos podem se disseminar pela circulação sanguínea e levar o paciente a apresentar embolia pulmonar, AVC (derrame cerebral), ou comprometimento renal. Os especialistas estão cada vez mais convencidos de que esses microtrombos estão associados à gravidade e à letalidade do novo coronavírus.

Os pulmões costumam ser atacados primeiro. Neles, o coronavírus mata as células dos alvéolos e faz com que elas se rompam. O pulmão fica inflamado, e a circulação dos vasos nessa região fica extremamente afetada, o que pode levar o paciente ao óbito.

Os respiradores tão em falta no mundo são apenas a ponta do iceberg das necessidades e do sofrimento do corpo atacado pela Covid-19. Os rins bombardeados pelo coronavírus precisam de diálise. Atrofia do baço, necrose dos gânglios linfáticos (onde são produzidas células de defesa), hemorragias, alterações hepáticas e degeneração de neurônios no cérebro, e até conjuntivite foram observados em alguns pacientes, segundo a Revista Science.

Há casos misteriosos de pessoas com níveis extremamente baixos de oxigênio, potencialmente letais, e que não demonstram sofrer de falta de ar. Uma hipótese é que o cérebro atacado não sinaliza ao corpo que ele precisa de O2. O ataque do vírus não apenas ao sistema respiratório, mas também ao sistema nervoso, é a hipótese mais provável para a perda de olfato e paladar, sintomas relativamente comuns na Covid-19.

A ciência ainda não desvendou como o coronavírus pode atacar o cérebro. Mas chamou atenção o caso de uma funcionária de 58 anos e sem comorbidades, de uma companhia área americana de. Com diagnóstico de Covid-19, ela desenvolveu encefalopatia aguda necrotizante, uma doença rara e gravíssima. Essa paciente teve sintomas como desorientação e perda de memória em apenas três dias. O caso foi descrito na revista médica Radiology. A mulher sobreviveu, mas não se sabe se terá sequelas.

Inicialmente se pensava que os casos mais graves eram causados não pelo ataque direto do vírus propriamente dito, mas à resposta exagerada do sistema imunológico. Essa reação descontrolada, chamada tempestade imunológica, causa uma inflamação generalizada. Mas agora, segundo estudos publicados nas revistas Science, Lancet e New England Journal of Medicine, cientistas suspeitam que, embora ocorra também a tempestade imunológica de citocinas, o ataque direto do vírus pode destruir órgãos e até matar.

Estima-se que 20% das pessoas com coronavírus adoecem com maior gravidade. Destas, 5% vão precisar de UTI. Os que evoluem para casos mais graves, os sintomas começam a se tornar mais severos entre o 8º e o 12º dia. Quase sempre, a pessoa começa a ter dificuldade para respirar, entra em fadiga respiratória, e pode ir para a UTI.

Como vimos, o novo coronavírus pode atacar muitos outros órgãos além dos pulmões, e médicos e cientistas alertam que estamos apenas no início da compreensão sobre os danos da Covid-19.

Pulmões: o Sars-CoV-2 invade as células dos alvéolos e começa a se replicar nelas. Células de defesa então tentam matar o vírus, mas acabam por causar inflamação. Esse processo inflamatório mais o ataque viral faz com que os alvéolos se rompam e a oxigenação do corpo seja afetada. O paciente passa então a tossir, a apresentar febre e dificuldade para respirar.

Fígado: mais da metade dos pacientes hospitalizados apresentam sinais de comprometimento hepático. As lesões poderiam ser causadas pelo sistema imunológico ou pelas drogas usadas no tratamento.

Rins: danos renais têm se tornado comuns nos casos graves e aumentam o risco de morte. O vírus já foi encontrado nos rins. Os danos podem ser causados tanto por ataque direto, como por inflamação ou ainda pelos microtrombos.

Aparelho digestivo: há evidências de que o coronavírus penetre nas células do trato gastrintestinal. Isso explicaria a diarreia observada em 20% dos pacientes.

Cérebro: casos de AVCs (derrames), convulsões, inflamação cerebral e confusão mental já foram observados em pacientes com Covid-19. Os médicos ainda não sabem se são causados pela ação direta do coronavírus ou pela inflamação associada a ele.

Olhos: conjuntivite acomete com regularidade pacientes em estado grave.

Nariz: a perda de olfato tem sido frequente em pessoas com Covid-19. É possível que a multiplicação do vírus nas terminações nervosas do nervo olfatório ou até mesmo inflamação desse nervo.

Aparelho cardiovascular: estudos de cepas, ou seja, variantes do novo coronavírus vêm mostrando que a SARS-CoV-2 exibe uma tendência de ligação a células com receptores específicos, dentre eles o principal é a enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2). Essa enzima é expressa principalmente em células endoteliais de vasos sanguíneos e em vários órgãos, incluindo o coração. Desta foram conseguimos entender melhor qual o fundamento das manifestações extrapulmonares. A SARS-CoV-2 modula negativamente a expressão de ACE2 nos sistemas cardiovascular e pulmonar, predispondo a miocardite e insuficiência respiratória, respectivamente. Por outro lado, a produção de citocinas pró-inflamatórias é aumentada, levando a uma resposta inflamatória exacerbada e ao estado de Síndrome Inflamatória Sistêmica.