Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 30% da população mundial sofre de doenças alérgicas, como rinite, asma, dermatite atópica.
As alergias são doenças multifatoriais causadas pela interação de fatores genéticos e exposição a fatores ambientais, onde o processo inflamatório é considerado o principal evento fisiopatológico. Esse processo inflamatório pode acometer a mucosa nasal (rinite), a árvore brônquica (asma) e também a pele (dermatite atópica).
O mecanismo imunológico envolvido nas alergias é mediado por anticorpos da classe IgE e o principal fator agravante ou precipitante das crises são os alérgenos ambientais; dentre estes, podem ser citados como os mais frequentes a poeira doméstica, ácaros, fungos, epitélio de animais, barata e pólen.
Imunoterapia
A imunoterapia para tratamento de doenças alérgicas é antiga, e teve início na Inglaterra no ano de 1911, pelos pesquisadores Leonard Noon e John Freeman. Os pesquisadores injetaram doses crescentes de extratos de pólens em pacientes acometidos da chamada “Febre do Feno” e observaram uma acentuada queda dos sintomas clínicos como rinorreia, prurido nasal, espirros desses pacientes. Nessa época, os mecanismos de ação da imunoterapia, não eram bem compreendidos.
A imunoterapia é definida como o tratamento de doenças alérgicas, realizado com base em uma vacina de alérgenos, os mesmos que causam a alergia em questão. Esta, por sua vez, eleva a imunidade do indivíduo para que este apresente menos sensibilidade a certas substâncias. Esta técnica de dessensibilização está indicada em casos especiais nos quais o paciente não consegue evitar exposição aos alérgenos e em situações em que não haja resposta adequada ao tratamento medicamentoso.
A imunoterapia consiste na administração de diversas doses, gradativas e cada vez mais concentradas, de extratos de alérgenos, aplicadas em intervalos regulares durante um longo período, que pode variar de um a cinco anos, até encontrar a tolerância clínica desses causadores de alergias em pacientes hipersensíveis, de forma a reduzir a sintomatologia após a exposição a determinado alérgeno.
Na fase inicial ou de indução, administram-se pequenas doses do alérgeno, aumentadas progressivamente, com base na sensibilidade individual de cada paciente, uma a duas vezes por semana, até atingir a dose de manutenção em aproximadamente três meses. A manutenção consiste em aplicações das doses de reforço com intervalo que pode variar de duas a seis semanas por um período de três a cinco anos, na dependência da relação dose resposta.
A imunoterapia atua no sistema imune e conduz a um estado de tolerância a determinados alérgenos, reduzindo a necessidade do uso de fármacos controladores da doença e da sintomatologia a longo prazo.
Apesar de todos os avanços na compreensão das doenças alérgicas respiratórias e do desenvolvimento de drogas eficazes para o controle da inflamação da via aérea e dos sintomas a ela associados, até a atualidade, a imunoterapia ainda é, junto com as medidas de higiene ambiental, a única estratégia terapêutica capaz de modificar a evolução natural da doença alérgica ao induzir a sua melhora e até mesmo a remissão e ao prevenir o seu agravamento, assim como o surgimento de novas sensibilizações, com efeitos duradouros mesmo após a sua suspensão.
As alergias precisam ser diagnosticadas corretamente para que possam ser identificados os tipos de alérgenos para a composição dos extratos, a quantificação dos mesmos para uma dose ótima de cada aplicação e o tempo de duração da terapia. O diagnóstico pode ser estabelecido depois de feitos a anamnese e o exame físico, acompanhados de exames complementares que podem ser testes cutâneos de leitura imediata (Prick Teste), e dosagem do anticorpo IgE específico no sangue.
A imunoterapia é hoje preferencialmente administrada por via sublingual, por ser mais segura e prática.
Estudos controlados demonstram que a imunoterapia específica com alérgenos é eficaz no tratamento de pacientes com asma, rinite alérgica e mais recentemente nas dermatites atópicas.
A imunoterapia alérgeno-específica, quando bem indicada, é o único tratamento capaz de alterar o curso natural da doença alérgica e, em alguns casos, promover sua cura. Previne a evolução da rinite para asma, além de dificultar o desenvolvimento de novas sensibilizações para outros alérgenos nos pacientes hipersensíveis.
Segundo a Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia & Sociedade Brasileira de Pediatria, as vacinas para alergia provocam diminuição dos sintomas de rinite e asma, com melhora perceptível na qualidade de vida da pessoa alérgica.
A imunoterapia específica apresenta benefícios únicos de longo prazo que incluem a manutenção da eficácia clínica após a sua descontinuação, a prevenção de novas sensibilizações e a prevenção de asma em pacientes com rinite alérgica. Assim, espera-se manter em repouso ou corrigir uma resposta imune já conduzida de forma exagerada e inoportuna.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, considera-se como critério de cura da imunoterapia específica desde que o paciente fique um ano sem crises de rinite alérgica ou asma; sendo assim, estudos recentes comprovaram 80% de cura e os 20% restantes melhoraram muito tornando as crises muito espaçadas.
A aplicação de dosagens ótimas das vacinas com os alérgenos aumenta a eficácia e a segurança da imunoterapia. Dose baixa de imunoterapia é ineficaz e doses elevadas de vacinas de alérgenos podem induzir uma elevada taxa de reações sistêmicas indesejáveis.
A imunoterapia é uma estratégia extremamente útil no manuseio das alergias respiratórias e mais recentemente na dermatite atópica, onde geralmente induz a remissão prolongada de sintomas, sem a necessidade de uso contínuo e prolongado de medicamentos, possibilitando a redução da dose e/ou da frequência de uso de drogas de alívio e de controle da doença, reduzindo assim o custo total do tratamento, aumentando a qualidade de vida e melhorando o prognóstico em longo prazo.
A adesão do paciente ao regime de imunoterapia específica pode ser a diferença entre o sucesso e o fracasso do tratamento, pois todo tratamento que necessita de longos prazos está sujeito a altas taxas de abandono.
Referências:
- Tamine Jandrey da Rosa. Imunoterapia específica para o tratamento de alergias respiratórias: uma revisão sobre seu uso. Rev. Bras. An. Clin. Vol. 49 Nº 4 Nov./Dez. 2017. doi: 10.21877/2448-3877.201600381.
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